Macumba sempre foi um prato cheio para a imprensa sensacionalista. Os jornais paulistanos e cariocas eram especialistas no assunto, principalmente porque isso significava uma maior venda de exemplares dos jornais. Apresentamos a seguir duas matérias publicadas no Diário Popular. Até no futebol a macumba era motivo de manchetes. Pai Nilson no Corinthians e Pai Santana no Vasco da Gama foram manchetes diversas vezes.
MACUMBA DE RICO CUSTOU
TREZENTOS MIL
Diário Popular, 20 de dezembro de 1990
Um despacho de 30 metros de extensão movimentou a esquina da Avenida João Paulo I com a Rua Padre Domingos Gava, na Freguesia do Ó, e fez a alegria dos pobres que passaram por ali na manhã de ontem. Montadas por um grupo de pessoas durante a madrugada, as oferendas tinham, além dos tradicionais pertences como charutos, frangos e velas, quilos de cerejas e uvas e muito camarão, a um custo aproximado de Cr$ 300 mil.
Em tempo de vacas magras o jeito é apelar para todos os santos. Se só as rezas não resolvem, a solução pode ser um despacho no cruzamento de uma avenida movimentada. Esta foi, provavelmente, a intenção dos autores de um despacho de aproximadamente 30 metros de extensão, que poderia se candidatar a uma menção no Guiness Book, o livro dos recordes, colocado em frente ao número 1510 da Rua Padre Domingos Grava, esquina com a Avenida João Paulo I, na Freguesia do Ó, Zona Norte da Capital Paulista.
Entre os tradicionais charutos, velas, frangos e pratos de farofa, canjica e acarajé, quilos de frutas da época como mamão, cereja e uva, e muito camarão, havia vários bilhetes agradecendo o bom ano e pedindo saúde e paz para 1991. Dois bilhetes traziam pedidos curiosos. Em um deles o autor, Fred José da Silva, pede para conseguir vender dois carros e ter condições de montar uma loja. Outro, de autoria não identificada, pedia dinheiro para pagar o INPS atrasado.
Segundo os moradores, é comum aparecer trabalhos naquele local. “Mas grande assim é o primeiro”, afirmou o funileiro Eugênio Moreira Sobrinho, que contou 20 frangos e dezenas de garrafas de champanhe, vinho e uísque. Mas logo no inicio da manhã muitas pessoas passaram apanhando as frutas e bebidas. “Levaram caixas cheias”, disse Eugênio.
Para Eugênio Sobrinho, que se diz médium, o trabalho foi feito por adeptos do Candomblé e seriam, no total, 13 e não apenas um despacho. “Isso não ficou por menos de Cr$ 300 mil”, acrescentou. Apenas o comerciante aposentado João Rodrigues, de 71 anos, disse ter visto os autores do trabalho.
Segundo o aposentado, era por volta de 0h 30 de ontem quando quatro carros pararam em frente à sua casa, que fica na Avenida João Paulo I, número 1478. Ele ouviu o barulho dos caros estacionando e desceu para verificar o que se passava. “Eu sai para a porta com um porrete, então eles passaram para outra esquina. Em seguida, passou uma viatura da PM e ouvi-os dizerem: nós já vamos. Quando a policia apareceu, eu entrei e fiquei observando de dentro. Os policiais foram embora e em menos de 20 minutos estava tudo arrumado”, afirmou.
João Rodrigues disse não saber quantas pessoas fizeram o trabalho “porque eles andavam muito rápido para arrumar tudo”, mas confirma que eram quatro carros e não havia pessoas conhecidas. O funcionário da administração Regional da Freguesia do Ó, Severino Cândido, que esteve no local recolhendo o material, calculado em aproximadamente 300 quilos o total do despacho.
MACUMBA NO CORINTHIANS
Diário Popular, 04/12/1991
Se macumba ajuda a ganhar jogo o Corinthians tem tudo para ser o campeão paulista. Pai Nilson, fanático torcedor corintiano, fez uma oferenda aos Orixás, com 197 velas, 197 rosas, duas vasilhas de pipoca, uma de canjica e um pote de água, e garante que o título ficará no Parque São Jorge. No Morumbi, o ambiente foi dos mais tranquilos. O técnico Telê Santana tirou o dia para contar piadas e o lateral Nelsinho ironizou o futebol moleque de Cilinho, afirmando que o verdadeiro esquema ofensivo é desenvolvido pelo São Paulo. Ronaldo, goleiro corintiano, também deu suas alfinetadas e declarou que a equipe tricolor só sabe dar pontapés.
O Corinthians vai disputar a final do Campeonato Paulista contra o São Paulo em desvantagem no regulamento, mas reforçado pelos Orixás. É o que garante Miranilson de Carvalho, presidente da torcida Trapalhões da Fiel e que é mais conhecido por Pai Nilson. Ontem à tarde, no Parque São Jorge, ele fez uma série de oferendas e logo em seguida, ao jogar os búzios, afirmou que os Orixás aceitaram tudo o que foi oferecido, e vão estar ao lado do Timão na decisão.
O conjunto de oferendas é chamado de ebó. O pai de santo distribuiu o trabalho em frente à estátua de São Jorge. Havia 197 velas coloridas, 197 rosas, duas vasilhas de pipoca, uma de canjica e um pote de água. “As rosas representam força, raça e vida; a canjica significa prosperidade e força coletiva; a pipoca representa os segredos da vida e a água é o símbolo da vida e força positiva”, explicou Nilson.
As velas foram acesas pontualmente às 18 horas, uma hora sagrada segundo Pai Nilson. “É uma hora de reflexão e muita energia e o momento em que os Orixás têm mais força para falar com Oxalá”, afirmou. O trabalho de Pai Nilson ainda não está completo. Falta o sacrifício de um animal, que será feito em seu barracão. “Não faço em publico porque tem gente que não gosta de ver. Vou sacrificar um carneiro pela paz do estádio, para que não aconteçam brigas e nem acidentes como o do rapaz que pisou em bomba no domingo”, afirma.
Pai Nilson disse que no começo do ano previu que o São Paulo seria campeão brasileiro e teria chances também de ganhar o Paulistão, mas a presença do Corinthians na final complica a vida do Tricolor. ‘Decidir com o Timão não é fácil, porque a torcida tem representantes de todas as religiões e isso dá muita força ao time”, afirmou.
SÃO PAULO CAMPEÃO
O Campeonato Paulista de Futebol de 1991 teve como campeão o São Paulo, que conquistou o título ao vencer o Corinthians na final, com vitória por 3 a 0 no primeiro jogo e empate sem gols na segunda partida. O artilheiro da competição foi Raí, do próprio São Paulo, com vinte gols marcados.
“Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano acabaria empatado”.
João Saldanha (Jornalista e técnico da Seleção Brasileira de futebol).
PAI SANTANA
Massagista, Pai de Santo e ex-lutador de boxe, Pai Santana chegou ao Vasco da Gama em 1953. Com passagens por Botafogo, Fluminense Bahia e Seleção Brasileira, teve sua imagem fortemente ligada ao Vasco, principalmente pelos trabalhos espirituais com os quais com os quais alegava ter beneficiado o time e prejudicado seus adversários em jogos importantes nas décadas de 1970, 1980 e 1990.
Na noite em que o Vasco quebrou o tabu, de 12 anos sem ganhar um título no futebol profissional carioca, o massagista Pai Santana fez a sua festa particular. Vestido de branco, acendeu 22 velas no gramado do Maracanã. Disse que era para agradecer à ajuda do caboclo Pena Banca. Levou ainda sal grosso, marafo e defumador. E fez um despacho no vestiário. Logo após, trancou a porta, escondeu a chave e disse aos atletas que não poderiam poderia entrar em campo antes do horário marcado. Se alguém não obedecesse a suas ordens, cortaria a sua corrente de energia positiva para a vitória. Terminado o jogo, o folclórico Pai Santana garantiu que Vasco 2 x 1 Botafogo foi por causa da sua reza brava.
Editor: Diamantino
Fernandes Trindade